Os políticos são ouroboros. Canhotos, destros, muro ou extremos. A dose do veneno só muda quando governo ou oposição. O interesse público parece um detalhe, entre dentadas de um no rabo do outro. Que tiro é esse? É dos próprios políticos, no haraquiri da política. O case do momento é a tentativa da oposição de instalar uma CPI para investigar possíveis ramificações do caso do servidor em cargo comissionado da prefeitura de Gravataí, preso em flagrante por suposta prática de corrupção passiva em operação da polícia civil.
É oportunismo político, não se enganem.
O CC resguardou-se ao direito de prestar depoimento só na justiça. Não há uma delação apontando envolvimento do prefeito ou de alguém do governo no que, pelo menos até agora, configura-se em um ato isolado de um servidor. Não há denúncia por empresários de outros episódios de achaque e nem a palavra do bandido, como vemos por aí nos métodos modernos de investigação lavajatista, dos quais sou crítico – quem me lê sabe bem.
Só neófitos da política acreditam que o objetivo da oposição vai além de tentar desgastar o governo e seus candidatos às vésperas de uma eleição que é uma espécie de prévia entre forças políticas que disputarão a prefeitura em 2020. Ou alguém crê que os vereadores têm técnica ou mecanismos de investigação como os da polícia civil ou do ministério público? Você imagina que, se há corrupção, algum empresário sentaria ao microfone da câmara para denunciar? Sim, porque recibo dessas coisas não existe.
Aberta a CPI, o que veremos será um grande palanque eleitoral, uma máquina de moer a reputação do prefeito e a credibilidade do governo que, como os exemplos além fronteiras mostram, praticamente para neste tipo de situação. Não esqueçam que hoje no Brasil suspeito é culpado e bandido bom é bandido morto, pelo menos no imaginário – para não dizer no gosto – popular.
Um símbolo do ouroburos pode ser testemunhado no facebook e fisicamente, logo após o flagrante da quinta e na sessão desta terça, onde o vereador Paulo Silveira (PSB) apresentou o requerimento com as sete assinaturas necessárias, mas saiu do plenário para evitar a votação onde a CPI seria derrubada pela base governista. É que na platéia estava Rita Sanco, ao lado de históricos petistas e do presidente Lucas Kirschke da Rocha, que postou nas redes sociais a cobrança de investigação para o que o partido descreve como ‘escândalo na educação’.
Obviamente, todos ali esperavam uma vendeta para a cassação da prefeita em 2011 por supostas irregularidades – nenhuma delas por corrupção e todas arquivadas ou nem denunciadas pelo ministério público. Rita foi uma vítima da política, de uma maioria circunstancial, no que costumo chamar de golpeachment. Mas ali estavam ela e seu PT, como algozes, transformando as relações do CC corrupto com o governo e o partido em justificativa para CPI.
Isso que, para usar exemplo de domínio público, o suposto delinqüente de Gravataí não fez uma delação como Antônio Palocci, e nem o empresário disse palavras mágicas como ‘Marco’, que corresponderiam ao ‘Lula’ que Deltan Dallagnol adorou ouvir, ou ao ‘Temer’ que Rodrigo Janot tanto queria.
Muitos tem me cobrado um posicionamento sobre o caso, cuja tenebrosa transação e contagem de dinheiro foi divulgada em vídeo com exclusividade pelo Seguinte:. Minha opinião é simples e coerente com a crítica que faço ao denuncismo geral da nação e ao envenenamento da política que, reafirmo, vem de canhotos, destros, muristas ou extremos, ao sabor do benefício eleitoral da vez. Se a investigação judiciária revelar indícios de corrupção sistêmica, ou mesmo se algum bandido entregar outro, aí sim, não se justificaria apenas uma CPI, mas uma comissão processante de impeachment.
Por enquanto, há um caso isolado de flagrante de um CC que, já exonerado, mesmo que em liberdade prestará contas à justiça no devido processo legal.
Por ingenuidade e desinformação, em minhas mais de duas décadas de jornalismo muito já ajudei a alimentar a cobra que morde o rabo. Hoje não parto mais do pressuposto de que aos políticos resta apenas presunção de culpa. Como sou um crítico do jacobinismo nacional, não serei instrumento para oportunismos políticos em minha aldeia. Tenho medo de uma democracia onde a política é odiada. O preço disso não há curtida de facebook que pague.
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